Traços Antropógicos do sagrado Cristão Antigo

02/05/2012 00:45

A concepção do sagrado cristão é extraordinariamente original. Parte do princípio de que Jesus Cristo é o Santo de Deus. A especial relação que Jesus Cristo viveu com Deus, fez com que se tornasse mediador de uma nova aliança. Nesta nova aliança, Deus comunica em plenitude a santidade e a justiça. Por isto, a novidade do sagrado cristão significa que Jesus conduz os seres humanos à santidade.
De acordo com René Girard, mesmo que os cristãos nem sempre o apliquem na prática, o específico do cristianismo está em subverter constantemente o primitivo e o mítico em nosso mundo. O cristianismo seria, pois, um princípio desorganizador da sociedade, que costuma revelar-se mítica em muitos aspectos. Mas, como os cristãos geralmente não são muito cristãos, tendem a não ser profundamente coerentes com o específico cristão, e, não raras vezes, tornam-se rigorosos sustentadores de certos mitos da sociedade. E o que seriam estes mitos? Para Girard, são os argumentos usados para fechar a boca das vítimas, ou então, a história narrada apenas de acordo com a leitura dos perseguidores4.
O conjunto de ritos para expressar o enquadramento neste projeto de Jesus Cristo é que veio a constituir, historicamente, um povo e uma comunidade humana. É por isto que a vida cristã começa com os ritos de iniciação cristã. Na verdade, estes ritos agregam questões cósmicas e culturais e levam a uma consagração do mundo (atualmente vem se procedendo a dessacralização). Um texto ilustrativo é Ap 4,3-8: santo, santo, santo é Deus onipotente... No Ap 6,10: destaca-se que os primeiros mártires pedem vingança pelo sangue derramado ao Deus
santo e verídico... Jo 17, afirma que Jesus se dirige para Deus: “Pai Santo” e pede que guarde os discípulos. Lucas (15) considera Jesus como divino e, diversos outros textos ressaltam que Jesus Cristo é o santo de Deus.
Uma diferença bem saliente se estabelece em relação ao Primeiro Testamento: lá o sacerdote fazia uma mediação entre o sagrado transcendente e o sagrado cultual. O Segundo Testamento destaca que o sagrado do culto deriva diretamente de Jesus Cristo.
A carta aos Hebreus (4,27-30) ressalta que a comunidade de Jerusalém estava cheia do Espírito Santo. Interpretava-se como Igreja, santificada por Cristo. Significava igualmente, que o envolvimento de Deus, de Jesus Cristo e do Espírito Santo se manifestavam no meio do povo. Também o texto de Ap 14,12 expressa este entendimento ao dizer que a Igreja é santa.
Uma peculiaridade da concepção do sagrado no Segundo Testamento não é o sagrado meramente sociológico, nem de tabu ou de proibições, mas, o sagrado fundamentado no Deus que é Pai, Filho e Espírito. Disto resulta uma grande novidade: a Igreja é o povo santo unido a Deus. O sagrado é percebido como uma realidade que se encontra além da percepção do círculo da existência humana, mas, este mesmo sagrado nasce da experiência que o homem faz do divino. Trata-se, pois, de uma experiência humana, e tampouco a entenderíamos se não fosse humana. Mesmo assim, a experiência humana não consegue apreender toda a dimensão do sagrado, pois apenas a capta em fragmentos que se manifestam em tempos, pessoas, coisas e lugares.
Deus não é nem sagrado e nem profano, mas SANTO, enquanto que o sagrado se manifesta entre o divino e o profano. Num longo período do primeiro testamento da Bíblia, Israel, por exemplo, entendia Deus como absolutamente transcendente, mas procurava acessá-lo pelo sagrado pagão purificado, ou seja, adaptando ritos de outros povos chamados de pagãos, como queimar vísceras de animais em altares do Templo. Já o sagrado cristão se fundamenta na pessoa de Jesus Cristo
No final da década de 1950, Mircea Eliade, iniciou um estudo ainda mais distinto, um estudo do sagrado, não apenas pelo que tem de irracional, mas pelo que revela na sua totalidade. Constatou que o sagrado é o oposto do profano. Uma pessoa entra em contato com o sagrado quando este se manifesta à pessoa. Esta experiência passou a ser denominada de hierofania (ou seja, envolve um fato em que o sagrado nos revela algo).

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