ÍCONES E ÍDOLOS
02/05/2012 01:21
Ícones, imagens e ídolos podem ser interpretados com uma mesma significação. Positivamente, o significado é de retrato, imitação, idéia, ou imaginação. Usam-se, também estes termos para um significado negativo de falsificação enganosa ou de erro de imitação.
Nos quadros cristãos, o termo “ídolo” geralmente recebe uma significação pejorativa, pois é visto como objeto de idolatria. Quando uma imagem ou um ícone teria esta dimensão enganosa ou ilusória?
Os ícones, imagens ou ídolos, ao remeterem para além do mundo sensível, são vistos como ícones no sentido positivo. Caso fiquem restritos apenas ao mundo sensível, então, são interpretados como ídolos. A grande dificuldade está em estabelecer uma divisória e a condição entre o mundo sensível e supra-sensível, isto é, qual é a linha da divisa e quem diz que uma imagem é ícone ou idolatria?
Uma imagem ou ícone, segundo uma crença tradicional, é um instrumento revelador do divino, ou seja, este objeto visível permite a manifestação do invisível. Podemos, pois, considerar como exemplo as imagens de santos ou de outras expressões do sagrado, que, para muitos católicos, é assunto inquestionável que eles remetem para além do sensível.
A pergunta impertinente que se pode levantar a este respeito é a seguinte: quem diz o que remete e o que não remete para além do sensível? Seria alguma autoridade eclesiástica? Poucas pessoas denunciam estas imagens como ídolos. Quando autoridades eclesiásticas declaram que estas imagens ou ícones que remetem para além do sensível, pressupõem que o ícone tem uma virtualidade em si mesmo que é a de revelar o outro mundo, o divino. Por exemplo, uma imagem de Cristo ou de alguma pessoa declarada santa, mais do que o retrato do personagem histórico, presume-se que esta imagem exprime uma experiência espiritual de santidade. O ser humano, com este objeto, participa do divino. Em outras palavras, este objeto remete à realidade invisível do divino. Torna-se, por isto, muito secundário o papel artístico de quem fez esta imagem, pois, centraliza-se o que a Igreja ensina a este respeito. Portanto, estimula-se o uso dos ícones para repelir os ídolos. Supõe-se que o ídolo atrai, convence e arrasta para si mesmo no mundo sensível e que não tem nenhuma capacidade de levar para além do sensível.
Por outro lado, quando o ícone tem a capacidade de mostrar e revelar o divino, atribui-se a ele um pressuposto de que tenha certa luz interior e própria, capaz de remeter ao transcendente.
O pensamento moderno sustenta, bem ao contrário, que não é possível este salto do ícone para o ultra-sensível. Sustenta-se, especialmente no pensamento filosófico, que qualquer obra de arte, seja religiosa ou de outra natureza, é apenas uma representação intelectual de realidades humanas ou sobrenaturais.
No pensamento teológico ainda parece predominar a noção de que um objeto visível pode remeter ao invisível, o que gera polêmicas: pode um discurso ou um ícone, da realidade humana e temporal contatar-se com o divino e o atemporal?
Na verdade, somente podemos discursar sobre Deus a partir de realidades humanas que nos envolvem. Por isto, o discurso teológico pode facilmente esconder, como Kant já denunciou, que se justifica o poder e a verdade em nome de Deus para um exercício banal de imposição sobre as pessoas, isto é, o que se prega como sendo exigência de Deus, pode não passar de um desejo do pregador.
Possivelmente seja melhor contar com medidas humanas do que aceitar esplendores de indicações categóricas deduzidas de ícones sobre as realidades ultra-sensíveis.
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