EPÍLOGO

02/05/2012 01:56

Longe de exaurir toda a riqueza antropológica que a Bíblia e a teologia cristã apresentam para a Antropologia Religiosa, destacamos alguns elementos centrais de valores humanos, não apenas pensados, mas particularmente sentidos por povos que estiveram à margem dos grandes poderes hegemônicos mundiais. Toda esta riqueza, que também se constitui numa aventura e fragilidade de experiências de fé com um Deus amoroso e dialogante, todavia, nos abre a sensibilidade para o vasto campo das hierofanias e os modos histórico-culturais em que tais experiências do divino ou do “totalmente outro” foram sentidas. Disto decorre uma questão muito séria para a Religião: como acolher os dados de uma ciência especulativa como a Antropologia e como oferecer os dados da Revelação divina, devidamente contextualizados para momentos históricos, com peculiaridades próprias de linguagem e de experiência do sagrado e do profano de cada época?
Na Religião ocorre um evidente risco de se exercer uma violência em nome do sagrado, quando se quer sustentar uma linguagem hierofânica para toda a multiplicidade de diferenças culturais. Ao se prender excessivamente a certas epistemologias ou tradições filosóficas interesseiras e, ao declará-las perenes, pode distanciar-se profundamente do que mais interessa aos seres humanos que é a plenitude da sua existência. Em outras palavras, a Religião pode transformar-se numa grande fonte colonizadora de mentes e de intelectos a partir de preceitos espirituais que facilmente fogem dos mais profundos anseios humanos.

A Antropologia, por sua vez, ao lidar com dados revelados e não manipuláveis para comprovações científicas, pode, também, restringir o profundo senso religioso da humanidade a meras manifestações culturais, criadas e divulgadas a partir de ceras pretensões de quadros sociais.
Além destes aspectos, salientamos no texto uma estranha polarização que se estabelece entre sagrado e profano, sagrado e divino, caos e cosmos, simbólico e diabólico, ícones e imagens, demonização e salvação que, de fato, nos situa num estranho quadro de auto-imagem ante as violências, mimetizadas ou claramente manifestas, que mais tendem a matar e a excluir do que a salvar. Uma evidência da nossa pequena abordagem merecedora de mais dados de entendimento é esta da desafiadora questão do como apresentar um projeto de salvação e de esperanças para o futuro da humanidade, que não implique em colonização, seja intelectual, espiritual ou cultural ou, seja de mortes e de satanização das diferenças. Sentimos, na verdade, que a maior ameaça de eliminação da vida humana no planeta Terra depende muito mais dos conceitos de sagrado e de religioso do que dos recursos das armas letais.

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